Escola da Exegese: Aplicação mecânica do direito
A compreensão deve ser focada no saber de que: o juiz, ao realizar a subsunção, segue um raciocínio lógico de inserir o caso concreto na norma. A subsunção é o ato de inserir o caso no concreto na norma para a aplicação mecânica do direito.
Escola da Exegese: Aplicação mecânica do direito.
De acordo com Bobbio, o Positivismo Jurídico concebe a atividade dos juízes como uma declaração de um sentido já plenamente contido na norma legal. Como diz Bobbio, trata-se da “teoria da interpretação mecanicista, que na atividade do jurista faz prevalecer o elemento declarativo sobre o produtivo ou criativo do direito.
A primeira distinção a ser feita é entre o texto legal (ou dispositivo legal) e a norma. O texto legal é o resultado do trabalho do Legislador. A norma é o sentido desse texto: o texto elaborado pelo Legislador é interpretado como um enunciado prescritivo (de dever-ser) e condicional (da forma “se …, então …”).Dada essa distinção, é possível: a) haver um texto legal que não expresse nenhuma norma.
Exemplo:
- É permitido o uso de dispositivos eletrônicos durante a realização das provas. O aluno que for flagrado usando dispositivo eletrônico durante a prova terá a prova confiscada e a ela será atribuída nota zero”. Não expressa norma porque o texto não tem sentido por ser contraditório: permite e proíbe ao mesmo tempo a mesa conduta!
- haver vários textos legais que expressem a mesma norma. Texto de lei: “todo cidadão, ao completar 18 anos, é obrigado a votar”; texto da Constituição: “o voto é obrigatórios aos maiores de 18 anos”. São textos diferentes, mas com o mesmo sentido, expressando a mesma norma.
- haver um texto legal que expresse mais do que uma norma. Texto de lei: “é proibido instituir imposto sobre livros”. Norma que permite imposto sobre um “e-book”: “é proibido instituir imposto sobre livros (livro é um objeto de papel, encadernado por uma lombada, com capa)”. Norma que proíbe imposto sobre um “e-book”: “é proibido instituir imposto sobre livros (livro se caracteriza pelo seu conteúdo, podendo esse conteúdo estar impresso em papel ou disposto eletronicamente) ”Quando se tratar de uma norma de conduta, a norma tem a seguinte estrutura (REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, 27ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002 p. 102):
Se “F”, então “C” deve ser. Se não “C”, então “SP” deve ser “F” – hipótese fática “C” – consequência jurídica “SP” – Sanção punitiva.
Vejamos um caso:
O dever de se votar no Brasil. Dispositivos normativos:
- Constituição Federal de 1988: art. 14; art. 7º, IV;
- Código Eleitoral, Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965, art. 7º;
- Lei nº 6.091, de 15 de agosto de 1974;
- Resoluções do TSE: Resolução 21.538/2003; Res.-TSE nº 21.920/2004.
Constituição Federal: Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
[…]
- salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
- plebiscito;
- referendo;
- iniciativa popular.
§ 1º – O alistamento eleitoral e o voto são:
- obrigatórios para os maiores de dezoito anos;
- facultativos para:
- os analfabetos;
- os maiores de setenta anos;
- os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.
[…]
§ 2º – Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.
[…]
Código Eleitoral, Lei nº 4.737, de 15 [e julho de 1965.
Art. 7º O eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o Juiz Eleitoral até trinta dias após a realização da eleição incorrerá na multa de três a dez por cento sobre o salário mínimo da região, imposta pelo Juiz Eleitoral e cobrada na forma prevista no art. 367. Art. 367. A imposição e a cobrança de qualquer multa, salvo no caso das condenações criminais, obedecerão às seguintes normas:
I – No arbitramento será levada em conta a condição econômica do eleitor;
[…]
§ 2º A multa pode ser aumentada até dez vezes, se o juiz, ou Tribunal considerar que, em virtude da situação econômica do infrator, é ineficaz, embora aplicada no máximo.(Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966);
§ 3º O alistando, ou o eleitor, que comprovar devidamente o seu estado de pobreza, ficará isento do pagamento de multa.(Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966). Lei nº 6.091, de 15 de agosto de 1974.
[…]
Art. 7º O eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o Juiz Eleitoral até sessenta dias após a realização da eleição incorrerá na multa de três a dez por cento sobre o salário mínimo da região, imposta pelo Juiz Eleitoral e cobrada na forma prevista noart. 367, da Lei 4.737, de 15 de julho de 1965.
[…]
Art. 16. O eleitor que deixar de votar por se encontrar ausente de seu domicílio eleitoral deverá justificar a falta, no prazo de 60 (sessenta) dias, por meio de requerimento dirigido ao Juiz Eleitoral de sua zona de inscrição, que mandará anotar o fato, na respectiva folha individual de votação.Resolução TSE 21.538/2003Art. 80.O eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o juiz eleitoral até 60 dias após a realização da eleição incorrerá em multa imposta pelo juiz eleitoral e cobrada na forma prevista nos arts. 7º e 367 do Código Eleitoral, no que couber, e 85 desta resolução.
[…]
Art. 85 A base de cálculo para aplicação das multas previstas pelo Código Eleitoral e leis conexas, bem como das de que trata esta resolução, será o último valor fixado para a UFIR, multiplicado pelo fator 33,02, até que seja aprovado novo índice, em conformidade com as regras de atualização dos débitos para com a União.Resolução TSE nº 21.920/2004.
Art. 1º O alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para todas as pessoas portadoras de deficiência.Parágrafo único.Não estará sujeita à sanção a pessoa portadora de deficiência que torne impossível ou demasiadamente oneroso o cumprimento das obrigações eleitorais, relativas ao alistamento e ao exercício do voto.Dados esses vários dispositivos, chegamos à seguinte norma:
- é brasileiro;
- tem de 18 a 70 anos.
Se alguém …
- é alfabetizado;
- não é conscrito;
- não seja portador de deficiência que demasiadamente oneroso o cumprimento das obrigações eleitorais, relativas ao alistamento, então:
- deve votar ou
- justificar até 60 dias após as eleições. Se “F” não votar; ou, “G” não tendo votado, deixar de justificar, justificar fora do prazo ou ter o indeferido o requerimento de justificação, então deve ser:
- condenado ao pagamento de multa no valor de R$ 3,51 a R$ 35,14, exceto se comprovar devidamente o seu estado de pobreza.
Todo enunciado condicional apresenta duas partes. No caso de uma norma, temos:
- o antecedente normativo (trazem as condições de fato, indicadas pelas letras de “A” até “G”);
- o consequente normativo (traz as consequências jurídicas, no caso, i, ii e iii).
As Condições de Fato enunciam determinados fatos da realidade que, uma vez verificados no caso concreto, fazem com que se deva aplicar a consequência jurídica. A Consequência Jurídica é uma previsão de determinada providência jurídica que um aplicador deve tomar com relação a um caso concreto, sempre que se verificarem aquelas condições de fato.Para a teoria da aplicação mecânica do direito, sempre que uma norma disciplinar um caso concreto, a decisão é vinculada, isto é, o aplicador do direito dispõe de critérios determinados e fechados para chegar à decisão. Em outras palavras, os critérios são objetivos e permitem uma única resposta correta.
Neste caso, a norma aplica-se por subsunção, ou seja, se o caso concreto se encaixar no antecedente normativo, então deve ser aplicado o disposto no consequente normativo; se ele não se encaixar, não deve ser o consequente.Fala-se em silogismo judicial:
- a Premissa Maior é a Lei, isto é, a norma;
- a Premissa Menor é o caso concreto;
- a Conclusão é a decisão judicial.
Basta ao aplicador da lei (um juiz, por exemplo) conhecer a Lei (isto é, ser capaz de passar do texto legal para a norma, extraindo do texto todas as condições de fato e consequências jurídicas ali presentes) e conhecer o caso concreto (como as partes devem provar o que alegam, é trazido ao conhecimento do juiz todas as circunstâncias relevantes do caso concreto, para que ele possa verificar se aquelas condições de fato foram satisfeitas pelo caso concreto), para chegar à decisão: ou se aplica a consequência jurídica (todas as condições de fato foram satisfeitas pelo caso concreto) ou não se aplica a consequência jurídica (pelo menor uma condição de fato não foi satisfeita pelo caso concreto).
A aplicação do direito é realizada como um cálculo lógico.Dados dois casos concretos semelhantes quanto às características determinadas nas condições de fato da norma, eles devem receber a mesma decisão de dois juízes distintos. Se isso não acontecer, é possível identificar o erro judicial cometido, bastando refazer todo o silogismo judicial e verificando se a subsunção foi corretamente aplicada.
Vejamos três casos concretos:
- João é brasileiro, tem 40 anos, é alfabetizado, não é portador de deficiência, não é conscrito, não votou nem justificou sua ausência. Este caso preenche todas as condições de fato; deve-se aplicar a consequência normativa, ou seja, deve ser condenado ao pagamento de multa.
- Mariana é brasileira, tem 28 anos, é alfabetizada, não é portadora de deficiência, não votou e justificou sua ausência dentro do prazo. Como uma das condições de fato não foi satisfeita (afinal, ela não deixou de justificar a sua ausência), não deve sofrer a sanção.
- Antônio, é brasileiro, tem 17 anos, é alfabetizado, não é portador de deficiência, não é conscrito, não votou nem justificou sua ausência. Como uma das condições de fato não foi satisfeita (ele tem menos que 18 anos), não tinha o dever de votar, não deve sofrer a sanção.
Referências
FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2008.
BOUCAULT, Carlos Eduardo de Abreu; RODRIGUEZ, José Rodrigo (Orgs.). Hermenêutica plural: possibilidades justifilosóficas em contextos imperfeitos. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
CAMARGO, Margarida Maria Lacombe. Hermenêutica e argumentação: uma contribuição ao estudo do direito. 3.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, 27ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002 .
BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico: Lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 2006.
______, BRASIL, Constituição da República Federativa de 1988. São Paulo: Saraiva, 2014.
______, Código Eleitoral, Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965.