Princípios Gerais do Direito, um dos meios de preenchimento das lacunas do ordenamento jurídico.

Princípios Gerais do Direito

Compreender que os Princípios Gerais do Direito são um dos meios de integração do direito, um dos meios de preenchimento das lacunas do ordenamento jurídico.

A Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942) determina:

Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

()

Também o art. 126 do Código de Processo Civil se refere aos princípios gerais do direito:

Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.

()

O termo “princípio” possui vários sentidos.

Tradicionalmente, entende-se por princípio geral do direito aquela norma que, mesmo não sendo escrita, encontra-se presente em todo o sistema, informando-o. Como exemplo, lembre-se do princípio de que “ninguém pode se aproveitar da própria torpeza”. Um candidato a prefeito dá causa à anulação das eleições. Quando o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que nova eleição deveria ser disputada, surgiu a dúvida: aquele candidato que deu causa à anulação do pleito poderia se candidatar à nova eleição? Como a legislação eleitoral era omissa, o tribunal resolveu aplicar o referido princípio e proibi-lo de participar das novas eleições.

Os autores divergem quanto ao conceito de princípio, pois acabam elegendo diferentes critérios para a tarefa de conceitua-lo: critério da abstração (os princípios são normas de maior abstração), critério da relevância (os princípios são os mandamentos basilares de um sistema jurídico), critério hierárquico (os princípios são as normas de maior hierarquia no sistema jurídico) etc.

Os autores também divergem a respeito da relação entre os Princípios Gerais do Direito e outros princípios, como os expressos na Constituição Federal (o da soberania popular, o da liberdade etc.), no Código Civil (a boa-fé objetiva, por exemplo), ou em outras leis.

Para uns, seriam conceitos distintos, pois os princípios expressos na Constituição ou em outras leis são normas válidas e vigentes, aplicáveis a todo e qualquer caso que lhe digam respeito; já os Princípios Gerais do Direito somente são aplicáveis em caso de lacuna, de maneira supletiva ao direito válido.

Para outros autores, contudo, trata-se do mesmo conceito, apenas a nomenclatura é que se modifica.

Como o chamado Pós-Positivismo, os princípios foram reconhecidos como verdadeiras normas jurídicas – a norma jurídica passa a ser entendida como um gênero com duas espécies, as regras e os princípios.

Uma série de distinções entre as regras e os princípios foram estabelecidos, especialmente quanto à maneira como ambos são aplicados e quanto à possibilidade de conflito (seja entre regra e princípio, seja entre dois ou mais princípios).

As obras de Robert Alexy e de Ronald Dworkin dedicam-se largamente a esses temas.

No que diz respeito ao sentido tradicional de Princípios Gerais do Direito, analisemos a seguinte ementa:

MEDIAÇÃO – COMISSÃO DE CORRETAGEM – COBRANÇA – DISTRATO POSTERIOR – NEGÓCIO INVIABILIZADO POR CULPA DO CORRETOR – NÃO INFORMAÇÃO SOBRE A EXISTÊNCIA DE ENCHENTES NO LOCAL – FATO RELEVANTE QUE INFLUENCIOU DIRETAMENTE NA RESCISÃO CONTRATUAL – SENTENÇA REFORMADA – O artigo 482 do Código Civil, repetindo o artigo 1126 do anterior, estabelece que a compra e venda considera-se obrigatória e perfeita, desde que as partes acordem no objeto e no preço. Já o artigo 725, sem correspondente no Código anterior, porém consagrando o que já era entendimento pacificado, estabelece que a remuneração é devida ao corretor desde que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ainda que o negócio não se efetive em virtude de arrependimento das partes. No entanto, se as provas produzidas indicam que o negócio somente não se concretizou pela falta de informação sobre enchentes existentes no local pelo corretor, fato este considerado relevante e que influenciou diretamente no distrato do negócio, evidenciando a culpa do corretor, a comissão de corretagem é indevida, pois é princípio secular que “ninguém pode se aproveitar da própria torpeza”. – Recurso provido, v.u. – . (TJ-SP – CR: 768382002 SP , Relator: Manoel Justino Bezerra Filho, Data de Julgamento: 11/08/2008, 35ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/08/2008)

Legislação citada:

Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço.

Art. 725. A remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes.

()

Na ementa proposta, o Autor ingressou em juízo requerendo o pagamento da comissão de corretagem em virtude de ter aproximado comprador e vendedor de imóvel.

O negócio não se efetivou por arrependimento posterior das partes; o que não afasta o pagamento da comissão de corretagem, conforme art. 725 Código Civil, especialmente porque aquelas estavam ajustadas quanto ao objeto e ao preço, incidindo o art. 482 do mesmo Código Civil.

Em sede de defesa, as Rés alegaram que o negócio jurídico não se concretizou por omissão do corretor em informar que o imóvel objeto da compra e venda sofria alagamento com as enchentes naquele local.

O Órgão Colegiado reformou inteiramente a sentença de primeiro grau, acolhendo o argumento das Rés de que houve omissão por parte do corretor ao não informar a possibilidade de enchente e alagamento do imóvel.

Para decidir que a comissão de corretagem não era devida, o acórdão se utilizou do princípio geral do direito de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza, isto é, o corretor não poderia se beneficiar da própria conduta faltosa para receber a comissão.

Referências

FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Saraiva, 1996.

MAXIMILIANO, Carlos. Hemenêutica e Aplicação do Direito. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

PALMER, Richard E. Hermenêutica. Lisboa: Edições 70, 1986.

STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2001.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *